...E ele não parava de repetir: 'A mente nos liberta, a mente nos liberta'...
Era tudo o que ele dizia, vivendo no seu próprio universo, vivendo no seu próprio mundo, na sua própria dimensão, um sujeito presunçoso, genial, e segundo a grande e patética camada considerada normal pela sociedade...um louco.
Este foi Karamá. Apenas Karamá, não se sabe de onde veio, não se sabe para onde foi. Alguns dizem que pretendia levar uma vida de alquimista, seguindo um estilo peripatético dentro de si, outros dizem que tivera uma vida complexa, árdua, feliz e no fim, danosa, e os mais comuns e patéticos o citam como um louco, apenas um louco.
Karamá desenhava, Karamá escrevia, Karamá só dizia o que citei anteriormente.
Dentro daquele hospício, todos tinham muito medo de Karamá, até os outros loucos. Isso talvez pelo estado translúcido em que Karamá ficava quase o tempo todo. Ele escrevia coisas belíssimas, em outras palavras era um verdadeiro artista, o artista mais puro, o artista mais presente, o típico artista de verdade, aquele que sofre pelo o que é, aquele que se eleva para a dimensão que realmente quer, aquele que depende de desgraças para existir.
Karamá não queria seu dinheiro, nem sua vida. Ele só precisava de alguns lápis, e papel, muito papel.
'Afinal quem é este homem?'...todos perguntavam. Realmente não se sabe. Só se sabe que Karamá foi encontrado próximo a um riacho, desenhando coisas na terra...e se cortando.
Depois de muita observação Karamá foi posto naquele lugar horrível, onde tudo o que de mais horripilante acontecia. Ele era diferenciado, não um louco comum, mas um insano, que usava isto para expressar tudo o que se passava naquela mente, aparentemente perturbada e imensa.
Ele tinha seu próprio universo, isso era incontestável, um universo extremamente restrito e secreto. Ele desenhava muitas coisas, coisas desconexas, coisas intrigantes, e coisas magníficas. Não tinha medo de se expressar, e muitas vezes, por essa falta de medo, era castigado, posto numa camisa de força e jogado num quarto escuro, sozinho.
Depois de muitas vezes castigado, Karamá escreve a frase mais brilhante que alguém já leu...
'P´ra que esta camisa de força? Se aqui já me reprimem de todas as formas possíveis? e Por quê não ver o mundo como uma grande camisa de força, uma vez que a repressão e a castração cognitiva é cada vez maior? Mas não vou me desperdiçar me embrutecendo com isso, minha mente eles não tirarão...". Os funcionários do hospício ao lerem isso ficaram furiosos com Karamá, e esta frase, assim, foi parar nas mãos do presidente daquele local, e este furioso deu ordens para que Karamá fosse executado.
Karamá, de um modo estranho e inexplicável, pressentiu sua morte, e pressentiu também que tinha um prazo de 2 dias. Logo, este não parou de escrever. Diariamente este era espancado, judiado, reprimido, assim como todos que pensam. E após as surras, sempre escrevia, não desperdiçou um minuto sequer desses dois dias.
Em frangalhos, com mais algumas horas de vida, este termina seu objetivo...aparentemente várias folhas bem velhas, guardanapos, papel higiênico, enfim...tudo isso junto, uma vez que seus papeis foram retirados à força, mas ele tinha um pequeno estoque em um pequeno esconderijo, onde as 'hienas' não iriam fuçar. Este monte de folhas tinha um título e uma capa. Não era necessário ser nenhum Sherlock para sacar que aquilo era um livro, e as palavras citadas na capa eram "Camisa de Força".
Karamá não consegue nem mais ficar em pé, e repete mais e mais a cada golpe a frase 'A mente nos liberta!'.
Ao bater do sino, Karamá sente que sua morte está por vir, chegam muitas pessoas, todos os curiosos, todas as hienas, todos os porcos imundos da sociedade, para assim terem um pouco de 'entretenimento', e para ocuparem suas vidas vazias e nojentas.
Karamá é julgado, em um júri patético, dentro do hospício, e lá é acusado. Todos aplaudem, riem, festejam, e se esbaldam com bebidas baratas.
Ao ir para a forca, Karamá pronuncia as suas últimas palavras:
"Eu sinto muito pela humanidade, eu sinto muito pelo mundo, eu sinto muito por essa dimensão, meus caros. Todos vocês não passam de hienas, que se contentam com o sangue do próximo derramado. Todos vocês, ditos cristãos, não passam de meros hipócritas, e ainda por cima reprimidos, reprimidos por pessoas mais inteligentes do que vocês, que os colocam em uma camisa de força, impedindo vocês até de pensar, os enganando com uma falsa felicidade...rica em vícios e excessos. Muito obrigado por tudo, mas principalmente, muito obrigado por me mostrarem que o verdadeiro caminho da felicidade é aquele de não ser uma pessoa igual a vocês! Eu estive em uma camisa de força quase por 5 anos seguidos, e vejo que tenho mais liberdade do que todos vocês juntos. Qual a diferença de viver em uma camisa de força, e viver da forma que vocês vivem? A mente nos liberta!"
Após esse discurso, todos se chocaram, finalmente Karamá falara algo que não fosse a frase citada primeiramente. Por fim, furioso, o presidente do hospício ordena que o apoio onde Karamá estava em cima fosse quebrado, e assim, Karamá falece.
O livro de Karamá foi encontrado, algum tempo depois, por um dos funcionários que o surrou. Este funcionário, por sinal, leu o livro...e se matou em seguida. Todos que leram esse livro vieram a se matar, dizimando assim um local podre, onde havia ditadura.
O objetivo de Karamá não era um suicídio em massa, mas...as pessoas que tiveram acesso ao livro eram tão podres, e o livro tão profundo, que ninguém resistiu a tais palavras.
"Você se fecha na tua maldade, se nutrindo do sangue do inocente. Te impedem de pensar, de agir, de falar...Você se impede involuntariamente, você vai se matando aos poucos, se fechando dentro da sua própria podridão. Agradeço por não estar mais aqui quando este livro chegar às mãos de alguém, e agradeço mais ainda pelo livro ter chegado às mãos de alguém."
Karamá
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